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Letras Finais na revista Discutindo Literatura
17/04/2008 / Simone Saueressig

Lançado em 2005 dentro da coleção “Grilos” da editora gaúcha Artes e Ofícios, Letras Finais do jornalista e escritor Luís Dill é mais do que uma amostra do que se pode fazer de bom na, assim chamada, Literatura Infanto-Juvenil. É uma das muitas provas de que Literatura se faz com bom senso, talento e muito trabalho, apostando na diversidade e em uma boa história, seja ela de que natureza for. Enquanto a Literatura Infantil e a Infanto-Juvenil permanecem enchendo prateleiras sem, no entanto receberem um espaço minimamente equivalente na já parca crítica literária existente na imprensa brasileira, passando, desta maneira, por ser uma espécie de degrau invisível entre o texto para o leitor que aprende a ler e o texto que visa um leitor já formado, escritores como Dill apostam na qualidade literária e no desafio, tanto para o autor, quanto para o leitor, seja ele de que idade e maturidade, for.

A história de Letras Finais é simples e pode ser facilmente encontrada nas páginas policiais dos grandes jornais: um menino de família de classe média baixa é confundido com o filho de uma família de posses e seqüestrado por engano. A partir desta premissa, Dill constrói Oswaldo, um personagem rico, complexo, cheio de coisas por fazer e dizer, cheio de dúvidas e dos “grilos” que o inserem no contexto da coleção. Oswaldo, adolescente, apaixonado, precisa conviver com o desejo de ser mais bonito, a busca da aceitação social, a lembrança da morte do irmão, ainda recente, e a certeza de que está com as horas contadas. Precisa conviver, enfim, com a condição humana, entremeada de lembranças e sentimentos e alinhavada pela esperança e pelos desejos que nos tornam a todos iguais.

O que chama a atenção no livro, além da qualidade do texto, é fato de o relato não ser linear. Não é à toa que Julio Cortázar é citado na página que antecede o início da história. Para narrar a agonia de Oswaldo, preso em um buraco com suas angústias e lembranças, o autor se vale do labirinto literário proposto por Cortázar em O Jogo de Amarelinha – cujo entrelaçamento, os leitores adolescentes prontamente reconhecerão, graças aos livros-jogo que tiveram o seu momento com o advento dos RPGs. O ir e vir entre os capítulos tira do leitor a referência física de quanto falta para acabar a história, e, com isso, cria uma ansiedade maior quanto ao desfecho da narrativa. Como na vida, não há como saber o que vai acontecer adiante, não adianta dar uma espiadinha na página seguinte, não há como calcular os acontecimentos pelas páginas que faltam.

E como se não bastasse, o leitor desatento, o leitor que espera tudo pronto de um produto cultural, mesmo após o final, se perguntará em algum momento, o que o título tem a ver com a história. Já o leitor curioso e atento perceberá que o livro apresenta ainda um outro jogo, espalhado ao longo dos capítulos. Um jogo que, se resolvido à altura, dará à vida incerta de Oswaldo não apenas um final, mas um rumo, um horizonte. Coisa que só a Literatura pode fazer por nós.


* Texto selecionado pela Secretaria do Estado da Cultura de São Paulo, publicado no site www.leialivro.com.br e na revista Discutindo Literatura, Ano 3, Nº. 16.

** Simone Saueressig é escritora e professora de dança. Tem vários livros publicados, a maioria para o público infanto-juvenil, além de contos premiados em antologias.

 

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